Glória - Victor Heringer

12 de dezembro de 2018

Título: Glória
Autor: Victor Heringer
Páginas: 295
Ano: 2018
Editora: Companhia das Letras
Gênero: Ficção 
Adicione: Skoob
Onde Comprar: Amazon
Nota: 
Sinopse: Os Alencar Costa e Oliveira não são uma família comum. Descritos como "doentes imaginários", eles se comunicam com chistes e diálogos zombeteiros. Além do humor idiossincrático, outra característica os une: ninguém da linhagem morre de doença ou de acidente. A melancolia aguda, fatalidade que se repete de geração em geração, é a maldição que ronda o sobrenome. Esta talvez seja a única tradição da família - a causa do óbito, invariavelmente, é o desgosto. Com erudição, graça e inventividade, Victor Heringer mistura referências literárias e notas de rodapé improváveis para criar a atmosfera nonsense e saborosa de Glória.
Este livro foi cedido pela Companhia das Letras, porém as opiniões são completamente sinceras. Não sofremos nenhum tipo de intervenção por parte da Editora. 

Resenha:


Paz na terra para todos os seres.

Para muitos, momentos de glória são conquistas de títulos, promoções, premiações, etc. A Glória para Victor Heringer seria se: “o leitor saísse do romance como quem saui de uma sala de cinema sem ter entendido direito a graça da comédia que acabou se assistir”. Posso dizer para nosso finado escritor que ele recebeu a mais alta das glórias onde quer que ele esteja. Porque honestamente foi exatamente isso que aconteceu comigo quando cheguei ao último ponto da história. Óbvio que a narrativa da história me foi de todo clara, mas as entrelinhas e as ideias inteligentemente colocadas nos cantos das frases ficaram lá escondidas, inibidas de se revelarem a mim, uma mera leitora. Nada mais que o usual.

De fato, a narrativa não me cativou da maneira como gostaria ou esperava, mas me surpreendi pelo rumo que as coisas foram tomando. Acompanhamos o desenrolar da lendária família Costa e Oliveira, na qual todos os seus membros morrem da doença do século: desgosto. No pequeno núcleo carioca que convivemos ao longo das páginas, o pai da família morre assim e deixa d. Noemi com seus três filhos, Benjamin, Daniel e Abel (todos batizados em homenagem a anjos do céu). Deus que é, era, gago, dá à essa pequena família o refúgio através da zombaria. Eles riem de tudo que se puder imaginar como uma maneira de passar por essa existência terrena. Até que os filhos crescem.

Abel foi a primeira ovelha a se desgarrar do rebanho. Negou a zombaria inata a seu sangue e saiu para virar pastor. Deus não é, era, gago. Daniel se envolveu com um emprego burocrático administrativo, casou e teve um filho, conseguindo aumentar sua riqueza observando o mar e não o contrabando carregado em seu local de trabalho. Benjamim, o mais velho, foi o que mais se perdeu em meio aos caminhos da zombaria. Artista plástico declarado, se contentava em viver da ate que fazia nas paredes de casa para irritar o irmão mais novo (Abel) que nunca vinha.

A história coloca mais os holofotes em Abel e Benjamim. Por mais opostos que os dois caminhos dos irmãos sejam, eles são muito parecidos. Ambos buscam a aprovação externa. Seja Abel através das palmas e ovações em seus cultos, seja Benjamim, pelo reconhecimento da sua arte e pelo amor impossível de mulheres. Os dois em determinado momento da vida renegam a zombaria, mas se vem constantemente puxados a ela, por uma força que não conseguem resistir.

O desgosto tem um papel central também na história. D. Letícia, uma das tias da família, escrevia o tão chamado livro da Breve e Concisa História da Família Costa e Oliveira, que era basicamente um manual detalhando todas as mortes da família que estiveram associadas ao desgosto. Preciso confessar que é algo bem louco e chega a ser engraçado algumas causas e modos de cura que são narrados a nós. É interessante porque, de fato, a associação do desgosto com a depressão (feita em alguns momentos) nos faz refletir sobre essa doença que realmente vem sendo conhecida como a doença do século. É uma tristeza sem tamanho que toma conta de nós, um vazio que estamos constantemente tentando preencher, em vão, com coisas que simplesmente aumentam esse vazio.

É engraçado ver como quando Abel abre sua Igreja no interior de são Paulo, a Igreja Global em Cristo, e sai anunciando esse mal que assola a humanidade, todos se assustam como se nunca tivesse passado pela cabeça deles que o desgosto é algo tão comum em nossa sociedade de hoje como respirar. Sempre precisamos que alguém nos ajude a abrir nossos olhos, selados a super bonder.

De fato, a leitura de um texto com esse teor de ironia e percepção sagaz da realidade não é simples de ler. Muito menos fluído. As vezes ela é bem louca e você se pergunta o que é que está acontecendo porque a confusão é um fato. É uma história que exige concentração e dedicação para levá-la até o final, mas garanto que quando você chegar lá (apesar sem entender direito a graça da comédia que acabou de assistir) vai fazer bons questionamentos. Para mim, Victor Heringer cumpriu muito bem seu propósito e, no epílogo, nos deixou com a pulga atrás da orelha sobre a veracidade dos fatos narrados que até então eram certeiros de terem acontecido em nosso sublime mundo. Se alguém descobrir, ao final, se realmente aconteceu ou não, vem cá me contar?

Paz na terra para todos os seres.

7 comentários

  1. Olá Maíra!
    Confesso que não me atraí muito pela história desse livro. Achei o enredo um pouco abstrato e não curto muito esse humor sádico. Porém o fato de abordar a depressão torna a obra bem relevante pois esse problema está adquirindo grandes proporções e muita vezes não é visto com seriedade. Num primeiro momento eu não encararia a leitura, mas não descarto a possibilidade.
    Beijos

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  2. Olá! Confesso que já fiquei confusa só lendo a sinopse, deu para perceber que o livro é daqueles que se não tomarmos cuidado durante a leitura, acabamos ficando perdidos. Mas ao mesmo tempo bem interessante, fui procurar saber um pouco mais sobre a obra e o autor e me surpreendi pela história que encontrei o que aumentou ainda mais meu interesse pelo livro.

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  3. Oi, Maíra!!
    Não conhecia essa obra do Victor Heringer, e por causa disso fui para internet pesquisar um pouco mais sobre o autor e suas obras e tive um choque tremendo em saber que o autor tão jovem já morreu. E com relação ao livro fiquei curiosa, pois nunca li um livro que tivesse um teor de tão grande e pungente de ironia e que marcasse a história.
    Bjos

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  4. Olá, é evidente que a obra possui uma complexidade narrativa que exige uma leitura atenta e gradual, para que seja possível extrair exatamente a ideia que o autor se propõe a nos transmitir. É interessante que o autor tenta abordar a patologia em questão com um viés cômico porém notadamente crítico, ainda mais se levarmos em consideração que o mundo contemporâneo é assolado por esse "vazio" citado na obra. Beijos.

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  5. Oi, Maíra
    Já li outras resenhas do livro, mas ainda não li.
    É um pouco complexo, mas não esta fora da nossa realidade e não duvido que pessoas morrem de desgosto.
    Hoje como muitos tem tudo ou batalham para ter que depois quando conseguem não tem mais graça e objetivo, sente vazia sem motivos para continuar.
    É uma leitura que vale a pena.
    Beijos

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  6. Não sei se seria um livro que leria fácil. Mas achei legal isso de ter mais do que o simples, mais coisas pra entender e coisas que a gente não vai. Isso de falar do "desgosto " e o peso desse assunto, até a coisa da igreja. Tem um jeito de fazer você pensar, mas não sei se seria dos melhores pra eu ler porque parece fugir muito do meu estilo. Ou talvez a graça estivesse nisso, não sei. De toda forma é uma dica interessante e diferente .

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  7. Não gostei muito não.
    Achei meio confuso e complexo.
    Pelo jeito tem boas reflexões.
    Mas como curto mais romanções, fico bem perdida com esse tipo de gênero.
    bjs

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